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sábado, setembro 27, 2003

Barcelona cap.5

Chegou mais um fim de semana. Também aqui ele é esperado por todos. Sentimos o frenesi das ruas que agora deixam de ser tao espaçosas. e sentimos a vontade de prolongar o jantar para que a noite chegue calma e o negro do céu dê rapidamente lugar ao reluzir de uma cerveja que acompanha uma conversa.
Ontem Andy (o alemao de minha casa) estava lá em casa com mais alguma malta. dois catalaes e uma peruana. A conversa parecia animada. eu acabara de chegar da universidade e a vontade de falar nao era ainda muita.
Todos sorriram e se apresentaram. pareciam receosos pela reacçao que eu iria ter. Afinal estavam em minha casa. Sentei-me com eles.
A peruana fazia um master em arquitectura e los chicos estudavam jornalismo e informática.
Os dois catalaes recordavam os tempos que haviam passado em frança, em Erasmus. Pareciam dispostos a receberem-nos como alguém um dia os recebera lá.
Esforçavam-se para corrigir o nosso castelhano aldrabado e queriam mostrar-nos que esta é a cidade deles: ”Vamos comer alguma coisa?”- disse um deles.”E que tal algo bem catalao? Pintxos.”. eu alinhei.
Pelo que ele disse, as tapas sao servidas em pratos e os pintxos em pequenas rodelas de pao. Cá o característico sao os pintxos.
Fomos entao ao bairro del Born, que me gusta mucho. Mais calmo que as ramblas, ilumina locais agradáveis nas suas ruas e praças mais cataläs.
Saborosos os pintxos. Inseparaveis de uma conversa e nao sao certamente para “encher barriga”. Curiosa a forma de os pagar: nós servimo-nos livremente e guardamos o palito que acompanham cada um deles. No final alguém conta os palitos e pagamos. Ora bem, o que pensa logo um Português quando sabe disto? : “Palitos? Pagamos os palitos? E quem guarda os palitos? Eu?” .Humm, os palitos pelo chao nao eram muitos.
Bem, mas pelos vistos espanhois, portugueses e alemäes nao sao tao diferentes como isso (Globalizaçao?) e na realidade viemos de lá com um descontozinho (nao de grandes proporçoes).
Depois fomos a dois bares. Conheci o mojito (rum+menta+gelo moido) e fiquei a saber que uma clara é cerveja+ limao e o tango é o mesmo que em Portugal (cerveja+groselha). Muito se aprende nas noites de Barcelona.

sexta-feira, setembro 26, 2003

As festas de La Mercè


De 19 a 24 de Setembro foram as festas de La Mercè. Posso dizer que é muito dificil alguém conhecer a verdadeira dimensao desta festa pois em todo o lado e ao mesmo tempo existe sempre alguma coisa. Coisa? sim. é impossível definir, pois à animaçao inerente ao dia-a-dia da cidade acresce a vontade de festejar aquela que é a festa maior de Barcelona. Surgem concertos, bailes, tradiçoes e as inevitáveis "personas" que a todo o momento buscam as calles e plaças com que mais se identificam.
Os turistas marcam também este ambiente mas Barcelona dá-se bem com os turistas. Eles representam uma parte importante da dinamica da cidade. existe uma simbiose entre as movimentaçoes dos turistas e dos residentes. Apesar de muitas vezes os caminhos se fundirem existe sempre um ponto de divergencia, uma aparencia distinta e objectivos diferentes que transformam Barcelona numa cidade onde a diversidade e a tolerancia facilitam a integraçao de todos.
Ao longo destes dias existem muitas actividades tradicionais das quais eu saliento os inevitáveis Castellers que arrancam verdadeiros aplausos da bonita praça st. Jaume. Os Castells sao uma competiçao de torres humanas. A competiçao é feita normalmente entre bairros, e cada “clube” exibe as suas obras primas. Pois é. impressionante. Na base estao muitas pessoas, essencialmente os mais pesados e fortes, depois sobem para cima deles mais uma quantidade consideravel de pessoas.depois mais quatro ou cinco.depois 3.depois mais 3.depois 2. e no final sobe uma ou duas crianças (cerca de 5 anos), que lá no alto levantam o braço anunciando o final da cosntruçao. A descida é entao iniciada rapidamente, pois nesta altura já as forças falham e naquele ambiente de medo que envolve a praça, a torre humana já vibra como que ao sabor de um vento que nao existe.as forças faltam.
No final a euforia de cada um dos que constitui a torre humana é grande e todos se abraçam como se o cansaço de todos os dias dificeis de treino que necessitaram se transformasse agora em gritos, risos e aplausos.
No dia 24 é feriado. Neste dia alguns museos têm a entrada livre. Aproveitei para visitar o Museo Picasso e o Museo da Historia da Catalunha. Neste último fiquei a saber que antigamente existia uma outra cidade chamada Barcino, sendo este museo as ruinas de algumas das suas antigas construçoes.é curioso pois estas ruinas situam-se por baixo da Praça del Rei o que significa que ao longo dos tempos os locais foram sendo reconstruidos e sofrendo mutaçoes de forma de acordo com a época em causa.
De qualquer forma nao é preciso esperar pelo dia 24 de Setembro para ir “de borla” (como tanto os Portugueses gostam) aos museos. No primeiro domingo de cada mes é possivel visitar alguns museus gratuitamente (Picasso é um deles).

quinta-feira, setembro 25, 2003

Barcelona cap.3


Nas horas que restam é possivel ter uma outra vida fora da universidade. O metro proporciona-me uma verdadeira passagem para outra dimensao, para um outro mundo. Desde a minha universidade demoro cerca de 10 min a pé para chegar ao buraco negro:a entrada do metro. Quando me aproximo sinto uma corrente de ar forte que parece anunciar a invasao de terrenos desconhecidos. Passada esta primeira fase, o vento desaparece e um ar abafado provoca suspiros prolongados a quem espera a passagem do próximo metro. Algumas pessoas têm ainda energias para contar as paragens que irao percorrer até casa, num mapa que se apresenta afixado, e verificar se estao no caminho certo. Ainda bem que nao tenho que trocar de linha.
O metro desorienta-me. confunde-me. Também por isso gosto dele. Nao sei se vou depressa ou devagar. Se ando muito ou pouco. E de cada vez que saio pela boca do metro a luz e todas as cores caem sobre mim com toda a individualidade de cada uma das suas paragens. Eu saio na paragem Liceu ou Drassanes. Ambas nas Ramblas. E é bem verdade. Desde que entro no metro até que saio posso ter andado 10, 20, 100km que o lugar onde saio é sempre bem distinto do de onde entro.quase como uma nova cidade.
Acho que é porque no metro a viagem nao tem uma continuidade visual. Nao comprovamos as pequenas diferenças que existem na transiçao de umas zonas para outras. As diferentes zonas nao se fundem, mantém sempre as suas características muito unicas.
Eu gosto que assim seja.
Gosto de sentir que acabando a universidade tenho outro mundo à minha espera,o que me dá um novo folego para aproveitar o dia um pouco mais .

sábado, setembro 20, 2003

Barcelona cap.2


Para além do "colchao" com pouca personalidade e das vistas estranhas da minha janela havia algo mais que nos primeiros dias me perturbava. Uma das coisas era as obras que estao a fazer na casa ao lado. Logo pela manha. Só pela manha. Outra era um verdadeiro congestionamento pulmonar que me fazia pensar que Barcelona é uma cidade com ar bastante poluído.Talvez. Bem, mas também me tinha instalado no quarto sem fazer uma limpeza prévia àquele que em princípio seria o meu refúgio Erásmico. Pus entao maos à obra impulsionado por um respirar ofegante e ansioso. Conseguiria resolver o problema? Limpei com uns panos que encontrei pela casa. Testei uns quantos recipientes de liquidos multicolores que surgiam nos sítios mais inesperados. “Lavei” o chao com uma água pouco saborosa que soluçava da torneira e sentei-me na cama com a luz ligada para ver se se viam particulas de pó pairando no ar.Nao.
No dia seguinte eu estava na mesma.e a mesa que havia limpado com cuidado apresentava uma camada de pó muito fino que naquele momento era o único acusado da minha “falta de ar”. De subito olhei a janela.e ouvi o batucar das obras do lado. Fechei a janela. Já durmo melhor.
O meu quarto é grande.As paredes brancas. A luz que entra pela janela nao é suficiente para que as paredes absorvam o calor, para que elas corem e sorriam. A sala é mais alegre. Dois sofás, um “puff” e um trono magricelas. Lá reina a cor de rosa e o vermelho que complementam bem a paródia de fotos coladas nas paredes e uns posters sem assunto, coloridos, que me permitem olhá-los sempre sem me aperceber que todos os dias eles se repetem.
Surgiu entao uma ideia! Vou pôr maos à obra e procurar uns quantos posters para afixar no meu quarto. Nessa tarde vagueei pelo bairro Gótico buscando aqueles que seriam os meus novos companheiros de quarto : posters. Caminhar no bairro gótico sem mapa é uma boa maneira para encontrar o que queremos. É o único sítio que conheço em que isto acontece. Em cada rua se sente o que nela existe. E lá estava. Uma loja com posters de tudo e mais alguma coisa. Anos 60 ,70, 80, arte, animais, paisagens, pinturas…e ia já na parte das pinturas quando começou a música. Uma pequena aparelhagem descarregava agora umas óperas enquanto eu percorria verdadeiras “galerias de arte” em posters: Van gogh, Picasso, Miró, Dali …
Sim. Vi alguns interessantes. Mas os preços nao eram convidativos (este é um pequeno pormenor do bairro gótico). Mas aquela musica, aquelas pinturas, fizeram-me perder a cabeça. Saí apressado da loja. segui o meu faro até à loja de belas artes mais próxima. Comprei umas cartolinas e uns lapis de pastel e fui para casa.
Já tenho uma pintura.Cheia de cores fortes e bem quentinhas. Tenho que comprar mais lápis.
Os dias passam agora mais calmos. Tenho aulas na universidade. Nao sei ainda que cadeiras vou ter, por isso vou às que me aparecem nos horários. Isto por aquí é complicado. Tenho que fazer 30 créditos em cadeiras mas para além de estarem os créditos noutra unidade o coordenador de erasmus aquí de Barcelona disse-me que 30 seria muito dificil fazer. Bem , ele saberá por quê. Como diz Andy (um alemao lá de minha casa) “Si,si...... está bien....”.

sexta-feira, setembro 12, 2003

Olá!
Pois estou em Erasmus em Barcelona e gostava de partilhar algumas aventuras que tenho vivido por cá.
Nao sei se ainda se lembram de mim. Continuo na mesma. Acho.
Neste momento já tenho uma habitaçao onde ficar. Após 10 dias de busca intensa encontrei uma casita a 5 segundos da plaça real e a 7 segundos das Ramblas. Lá encontrei um quarto com vistas para o interior do prédio, algo inédito no meu curriculum, mas com uma cama que dá para 3! Pena que tenha uma cova do meu tamanho. Estes dias tenho usado o meu conhecimento de estruturas para tentar equilibrar o colchao em cima de umas almofadas que foram despromovidas: passaram de cima para debaixo da cama. Estou contente porque a cama está a aproximar-se do razoável. Aqui a perfeiçao nao existe. Aqui o ideal é nao pensar em perfeiçao e esperar que uma cama com uma cova possa vir a proporcionar bons sonhos.
Encontrar casa por aqui é uma tarefa que se aproxima de uma missao-quase-impossivel-digna-de-um-super-heroi-que-ao-mesmo-tempo-ganha-um-ordenado-recheado-que-cubra-telefonemas-riscos-de-acidente-danos-morais-e-excessos-de-funcionamento-metabólico. Todos procuram casa por aqui.
Eu vi várias. Algumas parecidas com naves espaciais, em que a cama se insere no armário que por sua vez se transforma em escrivaninha quando, curiosos, batemos com a cabeça no tecto. Ou entao, outras em que uma cama doble vai de um lado ao outro do quarto tendo que se fazer um salto acrobático por cima de um armário para que a possamos alcançar (algo que me passou pela cabeça). Ou ainda umas, em que tudo parece bem até conhecermos os restantes habitantes: imaginem uma sala. imaginem 5 pessoas nessa sala. todos bem dispostos e a dizer “hoooolaaa !!!”. Bem. Uma rapariga parecia um travesti:grandes pernas,grande cabeça;grandes pés;grande “sorriso”(que eu retribuí). E grande mini-saia. O homem que me mostrava a casa só dizia “Vês a casa é muito grande e muito tranquila. Damo-nos todos sempre muito bem”.Ele tinha uma andar estranho. Existiam ainda mais dois ?homens?. um franzino, encolhido no sofá. Algo submisso mas risonho. Outro que passava despercebido. Daqueles que olhamos e nunca se sabe o que pensam. Por fim havia uma mulher que falava ingles.Mais velha.Nao imagino o que faria na vida.
A minha busca surpreendia-se sempre. Uma das primeiras que vi foi-me mostrada por uma rapariga com os seus 27 anos.Bonita.Com vestes angelicais (algodao branco) e com uma generosidade que a levou a pagar-me o autocarro. A casa era um pouco distante de tudo.Mas tinha piscina.Era um condomínio fechado que parecia luxuoso, o que se veio a confirmar quando vi o interior da casa. Sofás de couro, serviços de prata.Sala enorme! O quarto que me seria destinado seria talvez a divisao mais pequena da casa.Algo estava ainda para começar.Nós falavamos.Eu arranhava o espanhol.Ela oferecia-me sumo.Ela bebia sumo e comia amendoas algo distraida, enquanto eu lançava umas palavras para o ar: “Siempre esta tanto calor en Barcelona?”; Se ela estava estranha mais estranha ficou. Olhou-me nos olhos e disse. “Tudo está muito estranho.O tempo está muito estranho.”ficou pensativa.
Como que querendo mudar de conversa perguntou: “Porque escolheste Barcelona para estudar?”. Nao ousando perder tempo com teorias retóricas respondi: “Barcelona es muy grande.Tiene muchas personas diferentes e autenticas y isso me gusta”. Dizer isto foi como fogo.Ela voltou a olhar para mim fixamente. Disse :”se queres ver pessoas autenticas eu mostro-te pessoas autenticas.400 pessoas autenticas.que fazes sábado?”.
No sábado nao estaria em Barcelona.
Perguntei entao ao que ela se estava a referir.e ela: “sim, 400 pessoas autenticas.na praça de Espana. Se gostas de ver pessoas autenticas tens que ter sempre os teus olhos bem abertos.sempre atentos.ok?; Sabado te mostraria coisa autenticas.”.Foi entao que a conversa começou a ultrpassar o previsivel.”Eu já vi com os meus proprios olhos. pessoas sem braço ficarem com o braço. pessoas corcundas deixarem de ser corcundas. pessoas que nao andavam, começarem a andar. Só tens que creditar.Tu tens que acreditar.” Nesta altura eu já pensava duas vezes antes de falar, pois estava a falar com alguém que simplesmente nao conhecia e era-me completamente impossivel prever o desenrolar da conversa. Mas mesmo assim arrisquei: “sim é importante acreditar.mas eu normalmente se tenho que acreditar, tento acreditar em mim.” A cara bonita transformou-se e de súbito cuspiu para o chao. E enquanto calcava o cuspe furiosa, dizia:” Tu sozinho nao vales nada.És isto.Nada”.A chegada do metro (à vinda embora apanhamos o autocarro e depois o metro), tranquilizou a nossa conversa.Ela sentia-me um pouco distante e receoso.O metro parava:”Vais ver que gostas de Barcelona”.Espero que sim.
Aqui por Barcelona nao existe tempo.Tudo pode acontecer a qualquer hora. Tem imensas pessoas e onde há pessoas há oportunidades. Aqui há oportunidades.
Confesso que nao estou habituado a aproveitar oportunidades.por mais simples que sejam.Nao sei se irei embora a saber aproveitá-las. Para as aproveitar nao é só preciso vontade. É também preciso uma capacidade de resposta ao meio quase imediata.Uma abertura para a existencia de risco tao natural como cada passo que damos.Muitas vezes é preciso escolher.
Fui já uns dias à universidade.Senti-me em casa (com tudo o que isso tem de bom ou de mau).As instalaçoes sao boas.Mas nao tem cantina.Quem vive por cá deve ganhar bem.
De resto, ainda passaram poucos dias. Estou a habituar-me à cama, às ruas góticas onde a luz pode nao chegar mas onde sempre chegarao pessoas estranhas (aos poucos menos estranhas), conheço algumas pessoas mas poucas, vagueio pelas ramblas buscando novas surpresas e tento conhecer alguns locais bonitos. Ás vezes receio que a vontade viver novas experiências seja superior ao tempo que aqui vou estar ou às oportunidades que vou conseguir aproveitar.

quinta-feira, setembro 11, 2003

Carrer del vidre é um espaco de refugio Erasmico. É na verdade a rua onde moro aqui em Barcelona. Rua estranha? sim. Pessoas estranhas? sim. mas a fuga é certa e o caminho é curto. A luz e a música surgem das Ramblas e da Plaça Reial. Lá uma fonte brota pessoas que buscam a beleza de cada pedra normal.

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